7 de outubro de 2008

Ingenieros e seu Tratado sobre o Amor

Mexendo em meus arquivos informatizados, encontrei uma pasta do tempo em trabalhava com edição de livros. Contém diversas coisas sobre Ingenieros, de quem se estava por relançar a Criminologia. Dentre as anotações virtuais, todavia, que abrangem sua vida e obra, deparei-me com arquivos que trazem anotações sobre uma obra muito interessante intitulada ESTUDOS SOBRE O AMOR (Tratado del Amor). São passagens que, acredito, podem até surpreender os leitores, pelo contraste de comportamentos que variam de uma época para outra e, também, pelas observações que permanecem válidas. Desde já aviso que a referência que aparece é INGENIEROS, José. ESTUDOS SOBRE O AMOR ― “Tratado del amor”, Ed. Cultura Moderna. São Paulo, (124 p.). Sem data.

Do medo de amar

O desejo traz implícito um juízo de possibilidade; a esperança, ao contrário, é um cálculo subconsciente de probabilidades. A mente se entretém em medir as perfeições que atribui ao ser amado, comparando-as com os próprios méritos; merece-o? não o merece? São as perguntas que se formulam com ansiedade. É esse o momento mais fervoroso, bastando o menor grau de esperança para o aparecimento do amor. Não importa que ela falte depois de poucos dias; desde que o amor nasceu, persiste. Nas pessoas que tem necessidade de amar é muito fácil o aparecimento da esperança, sobretudo se não tiverem contrastes que viessem diminuir a sua fé otimista. Ao invés, os incapazes de amar, cheios de medo, desconfiados, são mais refratários ao aparecimento da esperança e só chegam a possuí-la depois de dificuldades que iniciem o processo da cristalização. De todas as maneiras, enquanto se define a esperança, o amor súbito nasce; se não se define, o medo de amar inicia a luta terrível entre a dúvida e a esperança, que se resolve pela intoxicação sentimental (p. 46 e 47).
A qualquer momento, o medo de amar pode vencer o desejo, e, então, o amor não nasce, morre em embrião. Nesses infelizes o desejo é vacilante; hoje avança, amanhã retrocede. Por momentos a imaginação voa, mas os sentidos não caminham. Homens apaixonados com a cabeça, fraquejam e se detêm quando a sua vitória está mais próxima; não se atrevem a amar completamente, depois de haver principiado a amar. Falta-lhes a confiança em si, não sabem com certeza qual é o seu ideal. Explica-se, na jovem tenra, uma certa inquietude da sensibilidade por falta de experiência; a de quinze anos não pode amar com tanta plenitude como a de trinta. A falta de ideal e a ausência de critério crítico faz supor à noviça que o primeiro desejo fugaz é uma paixão e crê que cada enamorado encarna o seu ideal; em tudo isto não há amor, senão artifício. Pouco a pouco, à medida que os sentidos lhes anunciam o artifício, sua imaginação tremerá com desconfiança; amará com menos pressa, porém, com mais ardor; o temor lhe impedirá de dar o sim, enquanto não estiver segura do que faz; será menos risonha, porém, mais apaixonada (p. 53 e 54).
Dos desenganos
O desejo pouco duradouro é aquele que correspondeu a um erro do ideal; na pessoa que se equivoca, a decepção sobrevém em seguida à satisfação do desejo. Isso ocorre constantemente com homens e mulheres, cujos atrativos físicos são superiores às qualidades de seu espírito; despertam facilmente um brusco desejo que, por sua veemência, pode parecer concordância com o ideal; delibação dos sentidos, reconsidera e adverte que não é esse o seu ideal, que se equivocou. Quantos homens se afastam da mulher amada ao ouvir palavras tolas de sua linda boca, como se fora uma espada de chumbo saída de uma bainha de pedrarias! Este é o maior consolo das pouco favorecidas, que cuidam mais do gênio e da graça, suas armas naturais; as belas soem descuidá-las e vivem pavoneando-se, como se já possuíssem todos os talismãs para cativar corações. As belas despertam mais desejos no homem, mas são menos amadas; o desejo farta mais depressa que o sentimento. E é por essa razão que as feias, quando chegam a ser amadas, não duvidam do rifão corrente que não necessitamos repetir. A flechada mais duradoura não é, geralmente, a que entra pelos olhos, mas a que se insinua pela inteligência ou pelo coração (p. 66 e 67).