Apresentação da edição brasileira de O HOMEM DELINQÜENTE pelo Professor Ms. Ney Fayet de Souza Júnior
Pode-se, em primeiras linhas, sem qualquer desacerto, afirmar que CESAR LOMBROSO é o responsável pela consolidação de um dos mais importantes paradigmas científicos (em matéria criminal) de todos os tempos.
Trata-se da abordagem do delinqüente como um ser dotado de especificidade (com características próprias, que poderiam ser, a partir de um estudo sistemático, agrupadas, fornecendo ao estudioso da ciência penal importantíssimas fontes de compreensão da dinâmica da criminalidade), contrariando frontalmente os postulados da Escola Clássica.
Desse modo, a filosofia lombrosiana, que se baseava no método positivo, estava bussolada pela necessária modificação das formas através das quais se interpretava a multifacetária questão da criminalidade (notadamente no que se vinculava à imprestabilidade dos métodos utilizados no combate à delinqüência), revolucionando-as de acordo com novas concepções científicas, muitas das quais presentes até os dias que correm.
Em breve excursus sobre a sua vida, deve-se indicar que, como médico militar, conheceu as prisões e teve os primeiros contatos com os delinqüentes. Posteriormente, foi médico dos criminosos alienados, tendo sido, em Pesaro, médico do Manicômio Judiciário. Nesse período, dá início ao processus de autópsia em grandes criminosos, denominados de grassatori, desenvolvendo pesquisas médico-científicas, cujo resultado encerra uma verdadeira doutrina, na qual se apresentam importantes análises sobre a criminalidade. Juntamente com dois outros italianos (ENRICO FERRI e RAFAELE GAROFALO), LOMBROSO contribuiu, nos fins do século XIX, para a fundação da Criminologia, ciência que, desde então, conheceu um extraordinário desenvolvimento.
A thesi lombrosiana, entretanto, encerrou, ao longo dos tempos, enormes polêmicas científicas, destacando a doutrina criminológica, os exageros, as hipóteses fantásticas e os erros que foram produzidos em suas pesquisas. Porém, deve-se a ele o mérito de ter iniciado o estudo do delinqüente. Daí porque afirmou GROSS que, se LOMBROSO não tivesse existido, nós teríamos uma lacuna na evolução lógica das idéias do pensamento da humanidade.
Sem dúvida, a história das ciências é mais rica em erros que em verdades, mas para o desenvolvimento do espírito humano um erro fecundo tem um valor infinitamente maior que um fato estéril (VERWORN).
De qualquer sorte, a obra de LOMBROSO é daquelas que permanecem, e isto é extremamente importante para se afirmar o valor de sua produção científica. Devemos partir de LOMBROSO, sempre que quisermos estudar o criminoso em sua dimensão antropológica, da mesma forma que devemos partir de MARX ou de PLATÃO, se quisermos estudar a dinâmica das relações sociais ou a filosofia, respectivamente. Conhecer, pois, em sua plenitude, a obra de CÉSAR LOMBROSO é a tarefa que se nos cabe, especialmente àqueles que dedicam interesse às ciências criminais. Em um mundo que, mais e mais, convive com intérpretes da criminalidade, que sugerem soluções novas — mágicas e nefelibáticas — para o seu enfrentamento, eu posso dizer: prefiro me obsoletar com LOMBROSO do que me modernizar com qualquer outro.
Por tudo isso, o Editor, Sr. RICARDO LENZ, está de parabéns, como também o estão os tradutores, Drs. OSCAR ANTONIO CORBO e MARISTELA TOMASINI, pelo magnífico trabalho realizado.
Prof. Ms. Ney Fayet de Souza Júnior
Professor de Direito Penal.