28 de dezembro de 2008

AS CARTAS XIII

Carta de Francisco para Maria de algum dia de agosto de 1924.
Maria,

Penso que foi para a sensação de receber flores que eu adoeci, tanto elas me satisfizeram. E nem tenho já quase vontade de restabelecer-me!... As primeiras violetas, as outras... Elas tomam quase sempre a forma das tuas carícias, quando as toco e quando as olho, e sinto-as com pura volúpia... Mas é um gozo triste, um gozo com sabor amargo de lágrimas, porque as violetas são tristes, e são tristes os seus longos olhos de melancólicas pupilas. São tristes como a morte...
Talvez, infelizmente, elas me ofereçam um símbolo... No destino de cada criatura, para seu sofrer eterno ou para sua eterna alegria, existe uma lágrima, a última, a que não nos é dado conhecer, que já se abeira do túmulo, e dele nos traz a amável sensação de alívio. E são certas flores as portadoras da forma visível desse fim, provocando, assim, nas criaturas, determinadas emoções reveladoras da sua proximidade. E, eu creio, a violeta é uma dessas flores predestinadas.
Mas, não filosofemos. Sejamos mais sábios. Falemos um pouco de ti. Que tens feito? E a minha ausência? Pouco te faz sofrer, não é? Ainda bem. Eu, entretanto, longe de ti, não sinto a vida. Trago, a queimar-me o peito, uma grande saudade do meu amor. É que eu te amo mais que a mim próprio. Coloquei o universo dentro do teu ser, e só por ele vivo e palpito. Encontrei, no mundo, a minha “pedra luminosa”... Na extinção da sua luz está a extinção da minha vida. E és tu a guardadora dessa minha pedra... Está nas tuas mãos, pois, a minha vida, a vida do teu,
para o sempre,
Francisco