2 de novembro de 2010

Respeito & Respeito

Impressiona-me o quanto se recorre à palavra respeito, para dela se extrair um conteúdo que cada vez mais torna as tais relações humanas sujeitas a esse verdadeiro chavão que não serve para outra coisa que não seja corroborar com a mais deslavada hipocrisia. Fingir respeito pelo que se desdenha e despreza é bem pior que o desaforo puro e simples. Daí os intratáveis tornarem-se cada vez mais raros, pois intratável é quem se atreve a expressar o que sente bem como sente, sem dar-se ao trabalho de adequar o discurso à platéia. Ao desaforo puro e simples podemos responder com outro desaforo puro e simples, e acabar rindo depois; porém, a respeitosa discordância nascida da normalização das relações sociais, esta já vem com a assinatura dos covardes e dos sonsos, donos dos discursos politizados, corretos e bem educados, eu diria, bem amestrados, e a esta muitas vezes só se pode responder com o silêncio, sob pena de nos contagiarmos nós mesmos com essa santidade repleta de boas intenções. E como se produz ruído com esse palavrório medíocre, com esse falso pudor, com esse ranço impudente que na verdade é sermão que pretende se colocar como discurso! Eu vejo isso muito bem, ao reconhecer o absoluto predomínio dessa forma melíflua de desaforo. Reconheço que prefiro lidar com a mais rematada grosseria, a lidar com essa nauseante postura diplomática típica dos covardes. Tem horas que isso simplesmente me cansa. E eu me pergunto como conseguem jogar assim e fingir que acreditam naquilo que sustentam? Bem, talvez por conta do lucro social, dos rentáveis juros que as platéias capitalizam às vaidades. É socialmente lucrativo parecer equilibrado, respeitoso, reconhecedor das divergências e das discordâncias, harmonizador das relações sociais, bem intencionados articuladores de cuja inocência ninguém ousaria duvidar ou questionar impunemente. Especialmente quando se conquistam platéias tão pródigas na produção dos aplausos tanto quanto dos elogios. Respeito? Quanta falsidade aí se disfarça! Talvez o verdadeiro sentido da palavra respeito não esteja exatamente onde a maioria, democraticamente, o coloca. Respeitar deveria ser reconhecer valor, reconhecer verdade, reconhecer no outro uma posição repleta de originalidade que nos enriquece de fato. Respeitar qualquer coisa, qualquer um, sacralizar assuntos ou temas apenas porque são tabus que não admitem discussão, ressalvando-os de quaisquer atentados, pelo simples fato de mostrar-se respeitoso é algo que rebaixa o próprio respeito à estatura dos covardes que fazem disso uma forma até hábil de sustentar sua dissimulação, angariando assim o mesmo respeito que tão habilmente pretendem demonstrar, prodigalizando-o a torto e direito. Respeito é bem outra coisa. Mas, como disse o florentino aquele, há muito tempo, ver é dado a todos; sentir, a poucos. E é bem mais cômodo deixar-se enganar e levar pelas aparências, do que penetrar na essência e no sentido que se esconde do outro lado do espelho.