30 de setembro de 2010
Gêneros de Primeira Necessidade
01. Silêncio na hora do samba, do carnaval, dos festejos pela vitória do outro time.
02. Teus olhos em mim, por dentro.
03. Uma caixa para eu colocar nela guardanapos de papel, lembranças, passagens, bilhetes, fotografias, recortes, entradas e tantos outros pedaços de saudade.
04. Qualquer lugar onde eu não atrapalhe, mesmo que seja muito frio e escuro por lá.
05. Etc.
27 de setembro de 2010
Sonetos que não são
Aflição de ser eu e não ser outra.
Aflição de não ser, amor, aquela
Que muitas filhas te deu, casou donzela
E à noite se prepara e se adivinha
Objeto de amor, atenta e bela.
Aflição de não ser a grande ilha
Que te retém e não te desespera.
(A noite como fera se avizinha.)
Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel
Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra.
( Roteiro do Silêncio(1959) - Sonetos que não são - I)
HILST, Hilda. Do Amor - São Paulo: Massao Ohno Estúdio - Edith Arnhold / Editores, 1999.
Aflição de não ser, amor, aquela
Que muitas filhas te deu, casou donzela
E à noite se prepara e se adivinha
Objeto de amor, atenta e bela.
Aflição de não ser a grande ilha
Que te retém e não te desespera.
(A noite como fera se avizinha.)
Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel
Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra.
( Roteiro do Silêncio(1959) - Sonetos que não são - I)
HILST, Hilda. Do Amor - São Paulo: Massao Ohno Estúdio - Edith Arnhold / Editores, 1999.
10 de setembro de 2010
Indefinível
Que canto há de cantar o indefinível?
O toque sem tocar, o olhar sem ver
A alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.
Como te amar, sem nunca merecer?
Amar o perecível,
o nada,
o pó,
é sempre despedir-se.
Hilda Hilst (1930-2004)
O toque sem tocar, o olhar sem ver
A alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.
Como te amar, sem nunca merecer?
Amar o perecível,
o nada,
o pó,
é sempre despedir-se.
Hilda Hilst (1930-2004)
8 de setembro de 2010
Rosh Hashanah
Rosh Hashanah, Ano Novo
Comemora-se hoje o início do ano 5.771.
Entre as tradições, deve-se comer uma maçã com mel para ter um ano doce.
Shana Tova!
Comemora-se hoje o início do ano 5.771.
Entre as tradições, deve-se comer uma maçã com mel para ter um ano doce.
Shana Tova!
Bebelle
A Sra. Lupin, mulher sem a menor espécie de educação, só aparecia nas grandes ocasiões, sob a forma de uma enorme pipa de Borgonha, vestida de veludo e dominada por uma cabecinha que se afundava em espáduas de cor duvidosa. Nenhum processo podia manter-lhe o cinto no lugar próprio. Bebelle confessava ingenuamente que a prudência lhe proibia usar colete. Enfim, nem mesmo a imaginação de um poeta, ou melhor, de um inventor, teria achado nas costas de Bebelle traços da sedutora sinuosidade que aí produzem as vértebras, em todas as mulheres realmente mulheres.
BALZAC, Honoré. A Comédia Humana. Os Camponeses, Vol. XIII, Ed. Globo, Porto Alegre, 1952, p. 211.
7 de setembro de 2010
Os Filhos do Espanto
Nossa arte é a cegueira causada pela verdade. Unicamente a claridade sobre o rosto que se crispa e retrocede é verdeira, o resto é mentira.
Franz KafkaO filho do espanto é um solitário esmagado por sua solidão. Vimos que a sensibilidade do homem solitário sofre, antes de mais nada, um choque com a desarmonia fundamental da realidade, seu absurdo, que lhe traz, propriamente, a consciência da solidão. A fidelidade a esse primeiro momento de pasmo denuncia o filho do espanto como o homem impotente para erguer-se de seu dramático desamparo. Tal impotência aponta, nele, um esgotamento nas suas intuições originais, um ser sempre mais sensível que reflexivo. O filho do espanto é, por isso, um puro artista, isento das exigências de soluçoes claras e definidas do filósofo. Franz Kafka é ainda o maior deles, o grande angustiado de nosso tempo.
Franz KafkaO filho do espanto é um solitário esmagado por sua solidão. Vimos que a sensibilidade do homem solitário sofre, antes de mais nada, um choque com a desarmonia fundamental da realidade, seu absurdo, que lhe traz, propriamente, a consciência da solidão. A fidelidade a esse primeiro momento de pasmo denuncia o filho do espanto como o homem impotente para erguer-se de seu dramático desamparo. Tal impotência aponta, nele, um esgotamento nas suas intuições originais, um ser sempre mais sensível que reflexivo. O filho do espanto é, por isso, um puro artista, isento das exigências de soluçoes claras e definidas do filósofo. Franz Kafka é ainda o maior deles, o grande angustiado de nosso tempo.
MACIEL, Luiz Carlos. Samuel Beckett e a solidão humana, Instituto Estadual do Livro, 1959, p. 41.
6 de setembro de 2010
Explicação
Tem coisas deprimentes que escrevo e que assustam quem gosta de mim. É que escrevo sem explicar. Daí contei do livro que, quando dá, quando posso, quando tenho tempo, quando me dão tempo e paz, eu escrevo aos poucos. E contei de Rebeca, meu alter ego, personagem dramática deste livro que não está pronto ainda. Rebeca Mazzalli é seu nome. E ela se faz passar por racional, embora no fundo seja tão mística quanto os místicos e ocultistas que a cercam no romance. Rebeca tem falas no livro, onde dá margem sempre a interpretações, porque ela simboliza um feminino que não se revela. Daí falar por metáforas. Eu lanço aqui no blog muitas falas de Rebeca. E como sou eu que as escrevo, não cito autor, naturalmente, pois a autora sou eu, embora a fala seja dela. Entenderam? Não? Simples. Sou eu, mas não sou. Certo?
Bem, é muito chato explicar o livro, como também seria muito chato explicar um quadro, mas eu não queria deixar ninguém triste, não. De jeito nenhum!
Até porque, seja como for, hoje ainda é segunda com cara de sexta e, com ou sem dor de cabeça, com ou sem pressão alta, com ou sem sal de frutas para baixar o sapão verde que engoli hoje, com ou sem aquele balaio cheio de outros sapos verdes e grandes que a gente tem de engolir, ainda assim é bom descobrir que, milagrosamente, alguém se lembra da gente... só para mim.
Bem, é muito chato explicar o livro, como também seria muito chato explicar um quadro, mas eu não queria deixar ninguém triste, não. De jeito nenhum!
Até porque, seja como for, hoje ainda é segunda com cara de sexta e, com ou sem dor de cabeça, com ou sem pressão alta, com ou sem sal de frutas para baixar o sapão verde que engoli hoje, com ou sem aquele balaio cheio de outros sapos verdes e grandes que a gente tem de engolir, ainda assim é bom descobrir que, milagrosamente, alguém se lembra da gente... só para mim.
Hora do adeus
Tem horas que a lucidez nos vem de pronto.
5 de setembro de 2010
Apesar de
... uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteiro, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.
Clarice Lispector
É, como diz a minha amiga Criss, só podia ser Clarice. Como é que esta mulher fala tudo sem dizer quase nada?
Clarice Lispector
É, como diz a minha amiga Criss, só podia ser Clarice. Como é que esta mulher fala tudo sem dizer quase nada?
4 de setembro de 2010
Surpresa
Eu não esperava. Olhei, e foi como receber uma porção de asqueroso escarro em plena face. Paralisou-me primeiro. Enojou-me depois, profundamente.
3 de setembro de 2010
Saudade
Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.
Clarice Lispector
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