13 de outubro de 2025

Inacreditável


Não que eu me importe. Afinal, não é da minha conta. Com tanta coisa para ocupar meu tempo, tantas coisas mais importantes. Quem liga? Olhei pela janela e vi apenas o de sempre. O gosto do café também era o mesmo e a roupa de ontem serve para hoje. Os objetos ocupam seus lugares e não ousariam fazer diferente. O som do rádio na mesma estação ecoa as mesmas vozes. Provavelmente estão dizendo as mesmas coisas que disseram ontem. Não, extamente. Que ontem foi domingo. Domingos não contam. A inutilidade não conta.

É inacreditável, mas, para muita gente, isso faz todo sentido. Não para mim. Importa-me o dia. A segunda. E é da minha conta, sim, que a semana comece no dia do aniversário do Bruno. Ele não sabe mais que é seu aniversário. Porque ele morreu. Sei que isso acontece com todo mundo, mas faz toda a diferença, quando acontece com quem não é todo mundo. Absolutamente. E, além de ser segunda, também acordei sem nada que me doesse no corpo. E também não estou gorda. Certo que passei dos 50, mas permaneço abaixo dos 51, o que me libera o pão. E também a torta de maçã que sobrou de ontem. Olhei pela janela e vi sol. E isso importa, porque as toalhas de banho vão secar ao sol. E há ventos de primavera. Sim, faz diferença. O gosto do café não é o mesmo, apesar de ser o café de sempre. Só que poderia não ser, pois ontem ganhei um café especial que poderia passar no lugar do café de sempre. Mas, como não passei, o de sempre não é mais o de sempre, exatamente, porque poderia não ser. E, não, as coisas não são as mesmas de sempre, pois há flores na casa. Em presença de flores, a casa fica diferente. Há mais alguém nos cachepots. Os de prata agora portam flores. De quebra, trouxe hortelã para casa. A planta desmaiou, é verdade, mas agora animou-se e está lá na copa. Parece que percebe minha presença, pois me lança perfume. Como se me perguntasse quando vou tratar de fazer um quibe com ela. – Ah, preciso da cebola e do trigo. Do guisado também. ― Anoto mentalmente as compras. O rádio. Não são as mesmas coisas. O mundo mudou um pouco desde a semana passada. Parece que esta semana menos gente vai morrer. É uma semana nova. E começou no domingo, que para mim não foi inútil. De qualquer sorte, mesmo que fosse, para mim, até a inutilidade conta. Afinal, é nestas horas inúteis como a de agora mesmo que escrevo coisas assim. Só pra te contar que não esqueci do dia 13 de outubro. Não esqueci do teu aniversário. E continuo sabendo o que fazer com nada. Transformando coisas em coisa nenhuma. Porque o que é inútil, justamente por isso, pode ser qualquer coisa. E isso é muita coisa. Horas inúteis têm abundância. Mas isso não é para todo mundo. É para poucos. Muito poucos.

12 de setembro de 2025

Esqueço das sombras

 

Sem retoques. Mas eu poderia editar esta imagem em uma nova versão bem proporcionada e com uma perspectiva correta. Inclusive sombras. Esqueço das sombras frequentemente. Dia desses, dei com a minha própria sombra, que desenvolveu o estranho hábito de circular pela casa quando eu leio e ela se entedia. 

9 de setembro de 2025

Cozinhar

 Pensando aqui se escrevo ou não que acho minha comida tão boa. Ridículo escrever uma coisa dessas. Não, nem sempre é tão boa, mas, em regra é, sim. Considerando a precariedade da cozinha, do tempo, a falta de muita coisa que gera a necessidade de improvisar. Uma lasca de bacon que corto e recorto e coloco para dourar no azeite com lâminas de alho. Não pode queimar. Controle da chama e, alcançada aquela temperatura que está quase lá, rodelinhas de linguiça mista fininha. Já o cheiro acontece com mais intensidade. Aguardo a cor que indica que o fogo, com seu poder transformador, arqueou as rodelinhas de linguiça. É hora do ovo. Um só. Que cai ali e se mistura, amalgamando cores. No calor de tudo, a farinha defumada que vai absorver a umidade que ainda resiste. Um toque de pimenta calabreza. Depois, azeitonas verdes picadas. Por último, pedacinhos de maçã gala. Tudo improviso. Toque final com salsinha picada. O risoto que fiz pouco antes é cheio de sabores. Tem carne desfiada e molho denso de tomate. Tem salsinha, pimenta, queijo grana e o brilho da manteiga. Faço tudo isso de olho no relógio, porque os processos tramitam entre prazos e boletos. Mas faço tudo muito atenta aos cheiros e às texturas. As coisas precisam se manter fiéis a si mesmas. O controle dos sabores deve ser rigoroso. Nada pode ser demais. O suficiente para que haja realce. A pimenta? Ah! Ela refresca tudo. É como uma rajada de vento que esfria um raio de sol, mas que, logo depois, faz com que ele fique ainda mais quente. A salsinha... o toque verde escuro que colore o prato. Provo um cubinho de maçã que me parece al dente, porque estava na medida certa e porque o leve adocicado que traz à farofa destaca o bacon, os mínimos pedacinhos que foram o primeiro ingrediente da farofa. Cozinhar é dominar uma ciência de misturas em que não pode haver inimizades. Mas ou menos como acontece com as palavras: se a regra é a harmonia, é preciso expô-la sempre às tensões que consagram doces e salgados, ingredientes suaves e ingredientes picantes, secos e molhados. Deve haver som, cores, e tudo funciona mais ou menos como nos textos em que palavras se encontram para temperar e operar sentidos do nosso paladar literário.

8 de setembro de 2025

Agendas


Setembro. E a primeira semana já se foi. O primeiro domingo. O dia 10 já está visível com seus invencíveis boletos. As agendas não duram mais tanto quanto já duraram um dia. Mistério. Evidentemente. Nada como inventar mistérios para deixar um dia de chuva e sossego ainda melhor.

6 de setembro de 2025

Então


Pensando aqui no sentido que se dá aos sábados. 

Há algo de especial nos sábados. 

O que é? 

Penso que pode ser o bolo. 

Ou melhor, o pão feito em casa. 

2 de setembro de 2025

Original


 

Coreografia da Precariedade

Um vaso que existe como promessa de quebra e que nesse risco se sustenta. Flores que se morrem, arrancadas ao solo e abertas à luz de um sol crepuscular que não mais alimenta a vida que vem depois da vida. Mesa infirme e vacilante. Estabilidade é ilusão. Janela que se abre ao fantasma da realidade retalhada pelo vidro que exibe uma paisagem ausente que contorna o impossível. Na coreografia da precariedade a vida nunca é plena: sobrevive no móvel, na cerâmica, na madeira, no vidro e até nas flores. Precária, a vida existe como intervalo, promessa, espectro.

27 de julho de 2025

Presentes! Mais presentes!

Sem palavras! Surpresa! Coisas que fazem os sábados se tornarem tipicamente sábados, dias de descanso, preguiça e gula. Porque, tirando o risco de eu ficar muito mal acostumada, há gestos que nos renovam. 

 


4 de julho de 2025

Um paradoxo epistêmico?

Teoria da Informação ou Teoria do Conhecimento? Hoje, a informação prevalece como o combustível que move a contemporaneidade. É a informação que alimenta a tecnologia, as relações sociais, a economia, a política e penso que até mesmo você, quando acessa seu celular todos os dias.

Nesse contexto, a informação supera a cognição em grande escala. Estamos todos saturados de dados que mudam a cada instante. Como processar e interpretar informações que se alteram velozmente? Bem, penso que a superficialidade nos socorre. Afinal, a velocidade do consumo é inversamente proporcional à profundidade da reflexão crítica.

A velha Teoria do Conhecimento dá lugar à Teoria da Informação. Não se trata mais de como entender, mas de como armazenar elementos brutos. E se a gente ressuscitasse a Epistemologia? O que ela poderia nos ensinar? Em primeiro lugar, eu diria que se trata de saber filtrar informações. Quanto tempo precioso a gente perde assistindo vídeos imbecis? Coachs disso ou daquilo? Rematadas inutilidades que se anunciam como a última verdade trazida pelo famoso Mister Quem do qual nunca se ouviu falar? Em segundo lugar, saber analisar. Todavia, isso depende de critérios e, caso você não tenha até hoje construído sua própria escala axiológica, dificilmente vai conseguir analisar corretamente uma informação para chegar, enfim, à terceira fase: transformar informação em conhecimento efetivamente significativo.

Creio que se está diante de um desafio proposto a cada um de nós: como equilibrar a quantidade de dados que consumimos com a qualidade do conhecimento que realmente adquirimos? Dizer que é necessário crítica e reflexão não significa coisa alguma quando não se faz a menor ideia de como se opera a construção de um saber. Então, nesse ponto, me ocorre que, considerando o atual estado da arte no que concerne a essa defasagem geométrica entre informação e cognição, talvez nem mesmo faça sentido escrever algo assim.

Ora, pensando bem, talvez a gente deva mesmo se deixar levar por essa corrente, seguindo felizes e satisfeitos o som da flauta mágica. Afinal, às vezes, o saber pode fazer de você um estorvo. E como obstáculos devem ser superados, talvez valha a pena deixar-se levar alegremente pela manada.

22 de junho de 2025

Coisas de Mister Grok

 Pois é. Avisei Mister Grok que eu era boomer. Sem problemas, ele respondeu, sou boomer friendly. Daí me explicou tudo, bem direitinho.

LSTM (Long Short Term Memory) O que é? Rede neural que “lembra” e “esquece” dados em sequências, usada pra prever padrões.

RNN (Recurrent Neural Network) O que é? Rede neural “recorrente” que processa sequências, lembrando o que veio antes. LSTM é uma versão turbinada dela.

GRU (Gated Recurrent Unit) O que é? Outra versão simplificada da LSTM, mais leve, usada pra sequências curtas como posts no X. É como uma LSTM mais econômica.

BERT (Bidirectional Encoder Representations from Transformers) O que é? Modelo de linguagem do Google que entende textos olhando o contexto todo (para frente e para trás).

GPT-4 (Generative Pre-trained Transformer 4) O que é? Modelo de linguagem da OpenAI, super conversador, que gera textos, responde perguntas e até prevê trends. É como um amigo digital que fala de tudo.

IIT (Integrated Information Theory) O que é? Teoria da consciência, citada por Chalmers (2022), que diz que consciência surge quando um sistema integra informações de forma única, como um quebra-cabeça.

API (Application Programming Interface): Ferramenta que deixa IAs como eu puxarem dados do X.

NLP (Natural Language Processing): Área da IA que entende textos e os analisa.

 

14 de junho de 2025

Absolutamente

Cês aí nem sabem, nem sonham, nem imaginam. Acabo de ganhar presentes! Inesperados presentes. Bem no sábado, dia de escritas e de pensamentos, de faxinas e reflexões. 

Bem neste sábado, quando lia Georges Perec ouvindo rock enquanto a roupa secava na secadora, porque, afinal, pode chover e, no fim, acabou chovendo. E, em meio ao insólito caoísmo do infra-ordinário da cotidianidade mais banal, chegam-me presentes, inesperados presentes, que são o cúmulo do refinamento.  

Upgrade imediato das percepções e da sensorialidade, porque é café especial e porque são pães de queijo que chegam em pleno fim de tarde.  

Memorável.  Absolutamente.