Sei o quanto sou repetitiva quando se trata de dizer o quanto gosto de café. Sim, pelo paladar, naturalmente. Mas, acima disso, pelo que representa. Café é aconchego, é acolhimento, paz e sossego. É minha casa recendendo a aromas que se cruzam no ar. É pausa para descansar. É o antes, para dar coragem, e é o depois, para reanimar. Sim, agora é o meu café, aqui de casa. Mas havia o teu. que era mágico. Tirado daquela cafeteira italiana achada em ferro velho visitado dia daqueles, pela estrada, por acaso. Mexias na máquina e, por incrível que pareça, tínhamos café espresso (sim, com s, italiano). E gostavas de me servir. Era tão nosso aquilo tudo. Acho que é ainda, porque eu soube, sim, não apenas saborear nossos cafés, como também cada segundo daqueles momentos que vivemos. Sem desperdícios.
Hoje ainda tenho meu café. Mas tu és agora todo ausência. Um oco cheio de ecos que se confundem às vezes: teu abraço envolvente, nossos silêncios, nossas mãos dadas, pequenos nadas que eram tudo o que tínhamos, riqueza que sempre soubemos reconhecer. Nos primeiros tempos, falávamos abertamente de amores, da sorte que era viver alguma coisa intensa, arrebatadora, extrema e, ao mesmo tempo, tão cheia de paz. Depois, não sei exatamente quando, passamos a evitar o assunto. Eram apenas nossos olhares, uma pressão nas mãos, um toque a mais nos abraços e éramos, enfim, cúmplices. E, como dizias, éramos nós dois, e o resto era apenas o resto. E o café? Ah, voltando ao ponto, sempre o café: havia o de Congonhas, das chegadas e partidas; o do Pátio do Colégio, lá no Museu; o daquela cafeteria: rodávamos quilômetros para ir até lá; e o nosso, sempre o nosso.
Difícil lembrar, mas esquecer seria muito pior. Na angústia, imaginar o nada onde te escondes agora, e saber que lá me faço presente, por certo que sim. E desta certeza, concluo que por lá, naturalmente, há café. E quanto ao resto? Ah, simplesmente não interessa. Apenas nós dois e um bom café. O resto? O resto é o resto.