27 de março de 2023

5 de março de 2023

Hakin Bey, um pouco mais

Quem anda por aqui já se encontrou com Hakin Bey, citado há algum tempo neste texto:

L’émergence du capitalisme produit un étrange effet sur l’amour romanesque. Je ne puis mieux l’exprimer qu’avec une image absurde: c’est comme si l’Etre Aimé était devenu le produit parfait, toujours désiré, toujours payé mais jamais vraiment consommé. L’auto-négation de l’amour romanesque s’harmonise parfaitement avec l’auto-négation du capitalisme. Loin de se contenter de moralité ou de chasteté, le capital exige la pénurie, pénurie de la production et du plaisir érotique. La religion, en interdisant la sexualité, a conféré une aura de prestige à l’abstinence. Le capitalisme occulte la sexualité et l’infuse de désespoir. L' Amour-obsession . Hakim Bey

Particularmente, achei muito provocante falar do amor nesse contexto. Numa tradução livre, ele nos diz que a emergência do capitalismo produz um estranho efeito sobre o amor romanesco. Só posso me exprimir, diz ele, com uma imagem absurda: como se o Ser Amado houvesse se tornado um produto perfeito, sempre desejado, sempre pago, mas jamais verdadeiramente consumido. A autonegação do amor romanesco se harmoniza perfeitamente bem com a autonegação do capitalismo. Longe de se contentar com a moralidade ou com a castidade, o capital exige a penúria, penúria da produção e do prazer erótico. A religião, proibindo a sexualidade, confere uma aura de prestigio à abstinência. O capitalismo oculta a sexualidade e a impregna de desespero. Então, não parece que precisamos mesmo repensar a maneira como entendemos o amor, buscando formas alternativas de expressão emocional que resistam às pressões da sociedade? De notar que ele fala em amor romanesco: expressão que tem pejorativo em relação ao amor romântico. Na primeira forma, corrompida, terminaria na autonegação implicada na busca do que é inatingível e idealizado. O amor romântico, por sua vez, permitiria a intimidade emocional, igualdade e liberdade entre os parceiros.

Mas de quem estamos falando mesmo? De Hakim Bey, pseudônimo de Peter Lamborn Wilson, um escritor, ensaísta e poeta americano que nasceu em 1945. Os temas de que se ocupa: anarquismo, teoria política e cultura marginal. Em 1990, destacou-se com o livro "Taz: Zona Autônoma Temporária", obra muito conhecida, que propõe a criação de espaços temporários de liberdade e autonomia fora do controle do Estado e do capitalismo. Vamos experimentar:

Of course, the Temporary Autonomous Zone appears not just as an historical moment, but also a psychospiritual state or even existential condition. Humans seem to need the "peak experience" of autonomy shared by cohesive groups - "free freedom" as Rimbaud says - not only in imagination, but in real space I time, in order to give value and meaning to the social. Now that we live in a world where (in the words of Lady Margaret Baroness Thatcher) "There is no such thing as 'society'," the TAZ seems more relevant than ever. Things may look different in other faraway lands, but from the point of view of the Beast's Belly it sometimes appears that the TAZ is the last and only means of creating an Outside or true space of resistance to the totality. BEY, Hakin. T. A. Z. The Temporary Autonomous Zone, Ontological Anarchy, Poetic Terrorism. New York: Automedia, 2003, p. X.

Em tradução livre, ele diz que é claro que a Zona Autónoma Temporária aparece não apenas como um momento histórico, mas também um estado psico espiritual ou mesmo como condição existencial. Os seres humanos parecem precisar de uma experiência de pico em termos de autonomia compartilhada por grupos coesos - "livre liberdade" como diz Rimbaud — não apenas na imaginação, mas no espaço real do eu no tempo, para conferir valor e significado ao social. Agora que vivemos em um mundo onde (nas palavras de Lady Margaret Baroness Thatcher) "Não existe essa coisa de 'sociedade', o TAZ parece mais relevante do que nunca. As coisas podem parecer diferente em terras distantes, mas, do ponto de vista da barriga da Besta, às vezes parece que a TAZ é o última e único meio de criar um outside, um espaço exterior, ou verdadeiro espaço de resistência à totalidade. 

Bey também é conhecido por cunhar o termo "ontologia do caos", que se refere à filosofia de que a realidade é sempre fluida e em constante mudança. Bey também é um defensor da teoria da "pirataria", que envolve a subversão da propriedade intelectual e da cultura mainstream, pregando o livre compartilhamento de informações e a criação de obras artísticas que desafiam as normas culturais dominantes. É também poeta e defensor das tradições espirituais do Oriente, principalmente o sufismo.

Enfim, me agrada a ideia de uma Zona Autônoma ainda que Temporária, com liberdade total para amar e para pensar, verbos nem sempre fáceis de conjugar, ao menos na prática.

Fatalidades

 


Mas é domingo outra vez? Tão rápido. E amanhã já é segunda? Enfim, fatalidades