14 de setembro de 2022

Encarar

 


Então, eu até cantaria wake me up when september ends, mas com insônia, não vai ter jeito. 


5 de setembro de 2022

Meu Jardim

Pegou!  

A expressão é esta: a mudinha "pegou". A gente diz bem assim, quando traz para casa uma planta qualquer que se quer por perto. Pois esta aí não apenas "pegou" como ainda floresceu. Uma semana ontem que aqui chegaram junto com as outras todas lá de Maristela. As amarelinhas foram arrancadas de um cômoro de areia, junto com uma "corda" de onze-horas extraídas com raiz e tudo, violentamente, obra de ogro que, vez por outra, resolve casos assim de foma definitiva. Primeira parada do bate-volta à praia, porque precisava ver o mar, apanhar pedras e olhar se havia flores. Havia, sim, onze horas rosadas e, mais adiante, perto de um banco feito de madeira e pedra, uma amarelinha toda colorida. Veio florida e murchou ao longo da semana, enquanto preparava o botão que abriu assim: completo, sorridente, absoluto.

A saber se os galhos de alecrim e mais a muda de hortelã vão se adaptar à mudança que, de um jardim, os relocou ao parapeito da pequena janela da salinha da TV, perto da cozinha: improvisos metropolitanos. Alecrim para dar sabor ao arroz; hortelã para fazer tabule qualquer hora. Todos em harmonia, ao lado do manjericão (sem ele não há molho vermelho que preste) e do tomilho (aquele gostinho de o que foi, mesmo?).

E assim o jardim vai ganhando novidades. Eu que me estranho, pois nunca fui muito de cuidar de plantas e, agora, me pego assim, observando essas criaturas. Ando até germinando sementes, tipo as macieiras que estão brotando lá na janela. Talvez eu tenha "pegado" o jeito. É um exercício de paciência observar mudanças tão sutis, silenciosas, que tornam essas formas de vida companhias discretíssimas. Plantas são sutis, mas sabem reagir na hora certa. Mostram sua satisfação ao gostarem de algo, e sabem como reclamar.

Há tristezas também. Receio que meu bouganville não voltará nesta primavera. Secou e não vejo nenhum sinal verde em seus galhos secos e quebradiços. Meus gerânios encruaram. O rosa, que floresceu, acabei quebrando. Imperdoável gesto de apressada estupidez. O vermelho não dá sinais de floração. Quanto aos feijões mágicos, apenas duas vagens em preparação. A saber dos brincos-de-princesa, planta que minha avó, Dona Josephina, adorava. Depois de passarem por vários cômodos da casa, se deram bem na sacada, e pararam de perder folhas e botões, como fazem essas plantas, quando se estressam. 

Convívio interessante. Plantas e pessoas têm seus traços inconfundíveis de personalidade, e exigem ser tratados cada um do seu jeito. Violetas, por exemplo, só querem paz. Quanto mais quietas, melhor. Não gostam de ser tocadas, principalmente quando florescem. São tímidas. As suculentas também não se prestam a intimidades. As espadas, todavia, parecem gostar muito daqui, porque crescem e se multiplicam em brotos cheios de vida. A coroa-de-cristo miniatura até cresceu um pouco, e parece haver se adaptado à vinhança de uma palmeira depressiva, que despenca as folhas e vive fragilizada, sempre insatisfeita. Os cactos são excêntricos e definitivamente exibicionistas. Na cozinha, uma curiosidade cheia de espinhos: supostamente comestível, dizem que é uma planta medicinal. Desde que chegou não para mais de crescer e, sempre que pode, me arranha. Parece-me bastante hostil. Em compensação, os trevinhos são pura alegria. Dormem à noite e se fecham em certas horas do dia. Em compensação, descobri que, sempre que chove, se enfeitam de diamantes e brilham olhando para rua. Minhas heras trepadeiras têm a serenidade dos estrategistas. Aos poucos, lentamente, vão tomando conta dos espaços, lançando guias para todo o lado, já alcançaram uma parede.

No meu jardim, não cultivo apenas plantas. Meu jardim é lugar de sabedoria e de aprendizado, porque, com as plantas, tenho aprendido a observar ações e reações cheias de sutileza: um exercício diário de paciência, já que o tempo do meu jardim tem outro ritmo e significação. Com tempo e paciência, aprende-se a esperar, dando ao tempo o seu próprio sentido que é o de oscilar, paradoxalmente, entre o sempre e o nunca.